A DISCIPLINA ECLESIÁSTICA – UMA ANÁLISE BÍBLICA E HISTÓRICA
A DISCIPLINA ECLESIÁSTICA – UMA ANÁLISE BÍBLICA E HISTÓRICA
Leandro Monte Alves
01 de novembro de 2024
Introdução
A disciplina eclesiástica é um
assunto essencial que atravessa toda a narrativa bíblica, evidenciando o
empenho de Deus em preservar a pureza e a santidade do Seu povo. A avaliação da
disciplina eclesiástica nas Escrituras nos conduz a uma ponderação sobre a
maneira como o povo de Deus deve abordar temas como moralidade, obediência e
restauração. Desde os preceitos estabelecidos no Antigo Testamento, onde Israel
é convocado a viver de acordo com as leis divinas, passando pelos ensinamentos de Jesus e as
orientações dos apóstolos no Novo Testamento, notamos que a disciplina é um poderoso instrumento que Deus deu a igreja para seu crescimento.
Este artigo tem como objetivo
analisarmos a progressão da doutrina da disciplina eclesiástica ao longo da história
bíblica. Compreender esses aspectos é essencial para que a igreja possa aplicar
os princípios da disciplina de maneira que promova não apenas a correção, mas a
edificação e a restauração dos indivíduos dentro da comunhão. Através de uma
análise cuidadosa, buscamos iluminar o papel da disciplina como um instrumento de amor divino, que
visa guiar os santos a uma vida de santidade com
Deus. A disciplina eclesiástica está intrinsecamente ligada à identidade
da igreja como "corpo de Cristo" (1 Coríntios 12:27) e "povo de
Deus" (1 Pedro 2:9). A igreja é chamada a refletir a santidade de Deus, e
a disciplina é um meio de preservar essa santidade.
O que é Disciplina Eclesiástica?
Segundo Mark Dever (What is a
Healthy Church? [O que é uma Igreja Saudável?, publicado no Brasil pela Editora
Fiel], de Mark Dever, p. 101), disciplina eclesiástica é o ato da igreja de
confrontar o pecado de um membro e chamá-lo ao arrependimento, podendo culminar
na exclusão da membresia e da Ceia do Senhor em casos de pecado grave e
impenitente. Ela também abrange, em um sentido mais amplo, tudo o que a igreja
faz para ajudar seus membros na busca pela santidade e no combate ao pecado,
como pregação, ensino, oração, inspiração, supervisão pastoral e edificação
mútua. Assim, a disciplina pode ser dividida em formativa, que é preventiva e
visa moldar o caráter cristão, e corretiva, que confronta o pecado com base em
passagens bíblicas como Mateus 18.15-17 e 1Coríntios 5. A prática da disciplina
eclesiástica pode ser informal, obter confrontos privados sobre pecados
menores, ou formais, quando envolver um processo público perante a igreja,
necessário em casos de pecados visíveis, graves e impenitentes. A disciplina
formal é aplicada apenas quando o pecado é exterior e pode ser testemunhado,
quando é sério o suficiente para não ser ignorado e quando o pecador permanece
sem arrependimento, rebaixando que valoriza o pecado mais do que Cristo.
Antigo Testamento
No Antigo Testamento, a
disciplina eclesiástica se fundamentava na compreensão de que Israel era o povo
eleito de Deus, designado para viver em santidade e em conformidade com a Sua
lei. O objetivo deste sistema disciplinar era manter a pureza do Povo de Deus. Para Walter Brueggemann , “a
disciplina em Israel estava ligada à compreensão de que sua identidade como
povo de Deus dependia da observância fiel das leis da aliança” (Brueggemann,
1997, p. 209). A Lei de Moisés, que incluía os Dez Mandamentos e diversas
instruções levíticas, cerimoniais e civis, formava o núcleo dessa disciplina.
Sua observância era essencial para garantir a santidade coletiva e definir o
padrão de vida do povo. Segundo Gerhard von Rad, “O sistema da Lei visava não
apenas regular a vida cotidiana de Israel, mas também assegurar que a presença
de Deus entre o povo não fosse corrompida pelo pecado e pela idolatria” (von
Rad, 1962, p. 78)
Sacerdotes e magistrados tinham
funções cruciais na aplicação e compreensão da Lei. Os sacerdotes eram
responsáveis pelos rituais religiosos, enquanto os magistrados lidavam com
questões morais e civis, estabelecendo penalidades específicas em situações de
desobediência para restabelecer a ordem. As penalidades iam desde advertências
e multas até punições mais extremas, como o apedrejamento em situações de
transgressões graves.
Outra forma de disciplina era a
exclusão temporária, na qual pessoas tidas como impuras, como pessoas com lepra
ou mulheres no período menstrual, eram afastadas da comunidade, representando a
distinção entre o sagrado e o profano. Roland de Vaux afirma que "a
exclusão e o isolamento dos impuros eram utilizados para proteger a comunidade
contra a contaminação, preservando a pureza essencial para o culto" (de
Vaux, 1997, p. "41". Esses casos demandavam cerimônias de purificação
para que pudessem voltar à comunidade e se envolver na adoração em grupo,
mantendo a pureza do local sagrado. Por outro lado, a idolatria era um dos
pecados mais graves e muitas vezes levava a penalidades severas, como a morte
ou o exílio. Os profetas alertavam o povo sobre o perigo de se desviar de Deus,
e a disciplina era uma forma de trazer o povo de volta à adoração exclusiva de
Yahweh.
Os profetas, além de sacerdotes e juízes, tinham uma função disciplinadora, incentivando o povo a deixar o pecado. Eles advertiam sobre a punição divina se Israel não se arrependesse, recordando ao povo a aliança com Deus e a exigência de integridade. Portanto, a finalidade principal da disciplina eclesiástica no Antigo Testamento era preservar a aliança de Deus com Israel, na qual Ele oferecia proteção e bênçãos em retribuição à obediência.
Período Intertestamentário
Durante o período interbíblico,
também referido como período intertestamentário, ocorreu uma transformação
notável na disciplina eclesiástica do judaísmo, impulsionada por alterações
culturais e políticas. Este período de aproximadamente quatrocentos anos entre
o término do Antigo Testamento e o começo do Novo Testamento foi caracterizado
pela influência de várias potências estrangeiras, tais como o Império Persa, os
gregos e, posteriormente, os romanos. Essas nações introduziram conceitos que questionaram a identidade religiosa dos judeus, que, em
resposta, criaram métodos rigorosos de disciplina para manter suas tradições e
convicções.
Um dos elementos centrais dessa
disciplina foi o surgimento dos fariseus e dos essênios, que buscavam formas de
resistir à helenização e manter a pureza dos valores da Torá. Como observa
Flávio Josefo, “os fariseus têm entregado ao povo uma série de regulamentos
transmitidos pela tradição, que não estão escritos na Lei de Moisés, e por isso
a seita dos saduceus os rejeita...” (Josefo, Antiguidades Judaicas, XIII.10.6).
N.T. Wright nos informa que, "as práticas de disciplina eclesiástica, como
observadas nos fariseus, foram uma resposta direta às pressões culturais e
políticas de um mundo helenístico e romano, buscando manter a pureza e a
identidade do povo de Deus" (Wright, 2004, p. 134). Para os fariseus, era
crucial que o povo judeu permanecesse fiel aos preceitos divinos, o que
envolvia uma disciplina rígida e o distanciamento de influências estrangeiras.
Neste cenário, a relevância das sinagogas aumentou, transformando-se em locais de estudo e culto que reforçavam a função do Templo em Jerusalém. Na sinagoga, líderes religiosos como escribas e fariseus se empenhavam em interpretar e instruir a Lei de Moisés, promovendo a prática religiosa cotidiana e a estrita observância dos preceitos. Como explica Emil Schürer, “no contexto intertestamentário, a sinagoga e a Lei Oral tornaram-se centrais para o judaísmo, onde os rabinos incentivavam uma aplicação rigorosa da disciplina para manter a identidade religiosa em meio a influências helenísticas” (Schürer, 1973, p. 211).
Na comunidade essênia, “a
disciplina era intensa; cada membro estava sujeito a uma hierarquia rígida e a
normas específicas de pureza e obediência, que eram seguidas sob pena de
exclusão” (Ferguson, 1987, p. 94). Portanto, no período interbíblico, a disciplina
eclesiástica se transformou em um sistema de estrita observância da Lei, em
resposta ao risco de assimilação cultural. Este cuidado com a
pureza se manifestou nos grupos religiosos que emergiram naquele período,
estabelecendo os fundamentos para a prática judaica no Novo Testamento.
Evangelhos
A disciplina eclesiástica nos
Evangelhos é um assunto importante para entender como Jesus e seus discípulos
lidaram com questões de moralidade, autoridade e a vida na igreja durante os
primeiros séculos do cristianismo.
Um exemplo claro da abordagem de
Jesus à disciplina é encontrado em Mateus 18:15-17, onde Ele instrui os
discípulos sobre como lidar com pecados entre irmãos: “Se o seu irmão pecar
contra você, vá e mostre-lhe seu erro, e, se ele ouvir você, ganhou seu irmão.
Mas, se ele não ouvir, leve com você uma ou duas pessoas, para que ‘toda a
questão seja decidida pela palavra de duas ou três testemunhas’. Se ele não os
ouvir, diga à igreja; e se ele não ouvir a igreja, trate-o como um gentil e um
publicano” (Mateus 18:15-17). Essa passagem destaca a importância da correção
fraterna na disciplina eclesiástica. R. T. France enfatiza essa
ideia ao afirmar: “O ensino de Jesus sobre a disciplina entre os membros da
comunidade enfatiza a restauração em vez da condenação, mostrando que a
intenção deve ser sempre a reconciliação” (France, 2007, p. 285).
Além disso, Jesus desafiava as
práticas religiosas que se concentravam mais na aparência do que na essência.
Em Marcos 7:6-7, Ele diz: “Bem profetizou Isaías a respeito de vocês,
hipócritas, como está escrito: ‘Este povo me honra com os lábios, mas seu coração
está longe de mim. Em vão me adoram; suas doutrinas são apenas regras de
homens’” (Marcos 7:6-7). Essa crítica sugere que a disciplina não deve se
basear apenas em regras externas, mas em um verdadeiro relacionamento com Deus.
Joseph A. Fitzmyer observa que “o ensino de Jesus não se limitava a
regulamentações, mas envolvia um chamado a um relacionamento verdadeiro com
Deus, que naturalmente afetaria a disciplina entre os seguidores” (Fitzmyer,
1981, p. 98).
Os apóstolos, por sua vez, também
abordaram questões de disciplina dentro da comunidade. Em 1 Coríntios 5:11,
Paulo exorta os membros da igreja a se afastarem de qualquer irmão que se
declare seguidor de Cristo, mas que viva em imoralidade: “Mas agora escrevo a
vocês que não devem associar-se com quem, dizendo-se irmão, for imoral,
avarento, idólatra, maldizente, bêbado ou ladrão. Com esse tipo de pessoa,
vocês não devem nem comer” (1 Coríntios 5:11). Douglas J. Moo analisa a
disciplina em 1 Coríntios, dizendo: “Paulo estabelece uma clara distinção entre
o comportamento esperado de crentes e não crentes, indicando que a disciplina
deve ser aplicada para preservar a integridade do povo de Deus” (Moo, 2000, p.
143). Isso demonstra a seriedade com que a disciplina era aplicada na
comunidade primitiva, enfatizando a necessidade de pureza e integridade entre
os crentes.
A disciplina eclesiástica também
se manifesta na prática da reconciliação e do perdão. Em Lucas 17:3-4, Jesus
ensina: “Se o seu irmão pecar contra você, repreenda-o; e se ele se arrepender,
perdoe-o. Se pecar contra você sete vezes num dia e sete vezes voltar a você e
disser: ‘Estou arrependido’, perdoe-o” (Lucas 17:3-4). Aqui, vemos que a
disciplina é acompanhada pelo chamado ao perdão, refletindo o amor e a graça
que devem caracterizar a vida da Igreja. John Stott reflete sobre o perdão como
parte integral da disciplina eclesiástica: “A prática do perdão é um aspecto
vital da vida da igreja, onde a disciplina é exercida não como um ato de
rejeição, mas como um caminho para a restauração espiritual” (Stott, 1989, p.
129).
Em síntese, a disciplina
eclesiástica nos Evangelhos é caracterizada por um balanceamento entre
correção, compaixão e uma procura por autenticidade nas interações.
Epístolas
A disciplina eclesiástica nas
epístolas é um tema significativo, refletindo como os apóstolos abordaram
questões de comportamento, moralidade e a vida na igreja nas primeiras igrejas.
As epístolas, especialmente as de Paulo, fornecem diretrizes práticas e
teológicas sobre a importância da disciplina para a edificação e a saúde
espiritual da Igreja.
Na epístola aos Gálatas, Paulo
enfatiza a importância de restaurar os que caem em erro: “Irmãos, se alguém for
surpreendido em alguma ofensa, vós, que sois espirituais, restaurai-o com
espírito de mansidão; e olha por ti mesmo, para que não sejas também tentado”
(Gálatas 6:1). Richard N. Longenecker observa que “a disciplina é uma expressão
do amor da Igreja, visando sempre a restauração do pecador” (Longenecker, 1990,
p. 218).
Em 1 Coríntios, Paulo lida com a
imoralidade na igreja: “De fato, ouve-se que há entre vós imoralidade, e
imoralidade tal como nem entre os gentios se pratica, a saber, que alguém tem a
mulher de seu pai” (1 Coríntios 5:1). N. T. Wright comenta que “a resposta de
Paulo a essa situação é clara: a disciplina é necessária não apenas para
proteger a integridade da comunidade, mas também para oferecer ao pecador a
oportunidade de arrependimento” (Wright, 2004, p. 104).
Em 2 Coríntios, Paulo fala sobre
a necessidade de perdão: “Assim, ao contrário, é necessário que, pelo
contrário, lhe perdoeis e o consoleis, para que por esse modo não seja
consumido de demasiada tristeza” (2 Coríntios 2:7). John Stott enfatiza que “o
perdão é essencial à vida da igreja, e deve ser praticado com a mesma
intensidade com que se aplica a disciplina” (Stott, 1989, p. 131).
Além disso, Paulo instrui a
Timóteo sobre a defesa da doutrina: “Como te roguei que ficasses em Éfeso, para
que admoestasses a alguns que não ensinem outra doutrina” (1 Timóteo 1:3). John
MacArthur ressalta que “a disciplina também é uma questão de preservar a
verdade do evangelho e proteger a igreja de falsos ensinos” (MacArthur, 1995,
p. 28).
Em resumo, a disciplina
eclesiástica nas epístolas é uma prática fundamental que visa a restauração do
pecador, a manutenção da pureza doutrinária e a promoção da unidade na igreja.
Cartas de João e Apocalipse
A disciplina eclesiástica nas
cartas de João e no Apocalipse aborda temas como correção, vigilância, pureza
doutrinária e a necessidade de perseverança na fé em meio a desafios. As cartas
de João, que incluem 1, 2 e 3 João, e o livro do Apocalipse refletem
preocupações com a santidade da Igreja e a importância de manter a verdadeira
fé em um contexto de heresias e perseguições.
Nas cartas de João, uma das
questões centrais é a luta contra a heresia, especialmente o gnosticismo, que
negava a plena humanidade de Cristo. Em 1 João 4:1, ele adverte: “Amados, não
creiais em todo espírito, mas provai os espíritos se são de Deus; porque muitos
falsos profetas têm saído pelo mundo”. Essa exortação à vigilância é um exemplo
de disciplina, pois implica discernimento e correção em relação a ensinamentos
errôneos que poderiam infiltrar-se na comunidade.
Em 1 João 4:1, o apóstolo João
exorta a comunidade a discernir entre os espíritos: “Amados, não creiais em
todo espírito, mas provai os espíritos se são de Deus; porque muitos falsos
profetas têm saído pelo mundo”. Philip Towner observa que “João enfatiza a
importância do discernimento, um elemento crucial da disciplina eclesiástica,
especialmente em tempos de heresia” (Towner, 2006, p. 125).
Em 1 João 5:16-17, João menciona
a intercessão: “Se alguém vir a seu irmão cometer pecado que não é para a
morte, pedirá, e Deus lhe dará vida; para os que pecam não sendo para a morte”.
A. W. Tozer comenta que “essa instrução sobre oração destaca a responsabilidade
mútua entre os crentes, onde a disciplina é também um meio de restaurar aqueles
que se desviam” (Tozer, 1986, p. 150).
Na segunda carta de João, ele
adverte contra os enganadores: “Se alguém vem a vós e não traz esta doutrina,
não o recebais em casa, nem o saudeis” (2 João 1:10). James Packer destaca que
“a rejeição dos que pregam doutrinas errôneas é uma forma de disciplina que
protege a integridade da comunidade” (Packer, 1993, p. 85).
No Apocalipse, em Apocalipse 2:5,
João diz à igreja em Éfeso: “Lembra-te, portanto, de onde caíste; arrepende-te
e pratica as obras que praticavas no princípio”. David E. Aune comenta que
“essa chamada ao arrependimento revela a função da disciplina como um meio de
restauração” (Aune, 1998, p. 105).
Em Apocalipse 3:19, a mensagem à
igreja em Laodiceia diz: “Eu repreendo e disciplino a todos quantos amo; sê
pois zeloso e arrepende-te”. A. M. M. de Silva observa que “a disciplina é
apresentada aqui como um ato de amor, sublinhando a intenção redentora de Deus
para com sua igreja” (de Silva, 1997, p. 202).
Primeiros Séculos da História
da Igreja
Durante o período patrístico
(séculos II-VIII d.C.), a disciplina eclesiástica era vista como um elemento
essencial para a vida da Igreja, tanto para a santificação dos fiéis quanto
para a preservação da unidade e pureza da Igreja. Os Pais da Igreja abordaram
esse tema de diversas maneiras, refletindo as necessidades de suas
épocas. A disciplina eclesiástica era vista como um meio de proteger a
Igreja de práticas imorais, heresias e influências pagãs. Os pais da Igreja
acreditavam que a Igreja, como "corpo de Cristo", deveria ser santa e
irrepreensível.
Tertuliano (c. 160-220 d.C.), por
exemplo, em sua obra De Pudicitia ("Sobre a Modéstia"), defendia uma
disciplina rigorosa, especialmente em relação a pecados graves como adultério e
apostasia. Ele argumentava que a Igreja não podia ser indulgente com o pecado,
pois isso comprometeria sua santidade. Santo Agostinho (354-430 d.C.), em
suas cartas e sermões, frequentemente abordava a necessidade de disciplina para
combater cismas e heresias, como o donatismo. Ele via a disciplina como um instrumento
de amor, destinado a guiar os fiéis de volta ao caminho da salvação. Em sua
obra "De Baptismo contra Donatistas", Agostinho discute a questão da
disciplina e da autoridade dentro da Igreja, abordando também a excomunhão e a
correção fraterna. Segundo Agostinho, "se alguém se mostra
perseverante em sua rebeldia e não quiser se submeter à disciplina da Igreja,
que se afaste de nossa comunhão, mas não sejamos rápidos em condená-lo; a
paciência da Igreja não deve ser confundida com a fraqueza de sua
disciplina." (De Baptismo contra Donatistas, Livro 6, Capítulo
4).
A aplicação da disciplina
eclesiástica variava de acordo com as regiões e as circunstâncias históricas.
Por exemplo, a Igreja no Norte da África (com figuras como Tertuliano e
Cipriano) tendia a ser mais rigorosa, enquanto a Igreja no Oriente (com figuras
como Basílio e João Crisóstomo) enfatizava a misericórdia e a cura espiritual.
Conclusão
Em suma, em uma cultura que valoriza o individualismo e o relativismo moral, a disciplina eclesiástica pode ser mal interpretada como uma intromissão na vida privada. É essencial que a igreja explique claramente que a disciplina é um ato de amor, não de controle.
A disciplina eclesiástica faz
parte do projeto redentivo de Deus para restaurar seu povo caído à condição de
refletir sua imagem, exercendo seu governo sobre a criação. Desde
Adão e Eva, cuja desobediência comprovada em exílio, até Israel, que também
falhou em refletir o caráter de Deus às nações, a humanidade distorce a imagem
divina como espelhos imperfeitos. Contudo, Jesus, o Filho perfeito, guardou a
lei de Deus e é descrito como “a imagem do Deus invisível”. Aqueles que estão
unidos a ele são chamados a reflexão essa imagem, crescendo em santidade e amor
através da vida na igreja. As Igrejas locais devem ser comunidades onde o mundo
vê a verdadeira imagem de Deus, testemunhando sua santidade, amor e unidade, e
glorificando-o. A disciplina eclesiástica é a resposta da igreja ao pecado de
seus membros, corrigindo falhas que distorcem a imagem de Deus, como um espelho
sendo polido para refletir sua luz de forma mais clara.³
À medida que lidamos com os
obstáculos da vida contemporânea, a compreensão e implementação desses
princípios tornam-se ainda mais importantes. A disciplina deve ser aplicada com
graça e discernimento, sempre com o objetivo de restaurar e evoluir espiritualmente,
ao invés de ser um instrumento de condenação. Portanto, a igreja tem a
responsabilidade de espelhar o caráter de Cristo, fomentando um ambiente onde o
amor, a verdade e a santidade coexistam, conduzindo cada integrante a um
vínculo mais intenso e genuíno com Deus. No final das contas, a disciplina
eclesiástica, baseada no amor e na verdade, é uma prova do comprometimento da
igreja em construir um corpo unido e fiel, apto a influenciar o mundo à sua
volta.
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